domingo, 25 de maio de 2008

lista infantil 1

cruzeiro do sul
três Marias
a mãe, a vó e a bisavó
chá de hortelã feito em vela no quintal
erva cidreira à noite
novela
ambrosia
nuvem de claras em calda de limão
cravos
sementes que estouram na mão
chiclete que estoura na boca
um chiqueiro abandonado
trilha no mato
líquen
leite de saquinho
alfajor
bicicleta vermelha
sapatos amarelos
aids
gosto da língua no jarro de barro
remédio para reumatismo
amaciante
pantufa
caxumba
flores coloridas do mato
flores laranjas do mato
cachecol de todas as cores
parque com caixa de areia
amoxicilina
paracetamol
tylenol
oxycilina
claritromicina
mercúrio cromo
cebion
biotônico
óleo de fígado de bacalhau
melhoral infantil
bactrim
polivitamínico
violeta genciana
colírio
mel
própolis
chá
escabin
nistatina
tripa de mico
seringa roxa
seringa vermelha
seringa amarela
toalha na mesa
cinco da manhã as xícaras batem nos pires na cozinha
febre

quinta-feira, 22 de maio de 2008

não entendo o que ela diz. vejo seu rosto submerso na água. fala muito rápido, o ar esconde sua cara e cada vez mais ela fica agressiva. não sei se deseja que eu retorne à superfície ou que eu termine algo que comecei. não me movo. debaixo d'água tudo é silencioso. não me movo.

domingo, 18 de maio de 2008

escrevo porque estive equivocado. todo esse tempo que pensei ser alguém das sombras foi desperdiçado. pertenço agressivamente ao dia e à luz. não posso dormir no escuro e só durmo bem se o dia já nasceu. e se é tarde, me divido entre sair ou adormecer tranqüilo. fico a noite inteira acordado esperando o dia. falei esse tempo inteiro de algo que eu não conhecia, na ausência disso que eu sabia eu inventava. inventava meu outro, em minha ausência. percebo isso e escrevo para que não me esqueça (tenho certeza de que não me esquecerei). precisarei tomar medidas: enfrentar a noite para dormir bem e não passar o dia exausto. acolher-me na luz que não sei descrever. não é quente. estou acostumado a descrever pela ausência, como pode notar. precisarei não esquecer (porque sei que isso que digo moverá algo muito leve e eu posso me esquecer e voltar ao hábito). soou grave porque foi escrito do jeito que eu já sabia (tubas e metais pesados). tentarei escrever com outro elemento.

terça-feira, 13 de maio de 2008

quantas vezes passar aqui
cada vez que passa esquece-se de algo
que levaremos dele hoje?
os olhos, o estômago, os pés
- as moedas cintilaram, a roca girou, o fio esticou-se
- escreveram meu nome numa placa de chumbo com a ponta de uma faca
- desenharam meu corpo e ofereceram aquilo que não as pertencia
- perguntam meu nome, não o digo
- e quando me perseguem, me lanço nesse rio negro
- ouço a besta dormindo

terça-feira, 6 de maio de 2008

(creio não ter lido uma só página que eu não acreditasse dizer algo sobre mim. e enquanto lia os artigos e imagens, procurava aprender mais sobre mim. cúmulo: não me interesso por aquilo que não seja eu. não desejo ausentar-me e deixo meus traços. inverte-se, as coisas me olham, em busca de si. digo a elas meu nome. desinteresso-me pela memória das coisas. e me queimo suavemente para que não me esqueça)

segunda-feira, 5 de maio de 2008

morning

domingo, 4 de maio de 2008

não tenho certeza, pelas fotos veladas e pelo que escrevi em mim, palavras que esqueci, incompletas, pequenos desenhos sem perspectiva, cruzei o letes. estou descalço. até a dor esqueceu-se. o sono deixou de vir e esqueci como se respira sozinho, me esforço para ser. os desenhos esqueceram da sua imobilidade e andam pelo meu corpo: tigres negros e flores de cobre. cada coisa esqueceu-se de si e tornou-se a outra. espero de braços abertos a chuva que virá do chão, feita de cobre derretido e jade. não me lembro do nome das coisas, acho que me confundo.
depois de lamber a noite fugido, encontrei
o primeiro rio sem água
não por isso:
nele corria fogo

quinta-feira, 1 de maio de 2008

a besta-fera me escolheu como seu apóstolo e me ungiu com sua língua cor de ouro.
o que era perdeu o seu nome. a besta-fera açoita cachorros durante a noite e cavalga sobre nós. preciso descobrir o nome do que é. durante a noite, junto minha câmera e papel e parto em direção aos rios. faço o sinal da cruz e, enquanto anoitece, entro na floresta, para que a besta não me encontre com seus dentes cor de palha e olhos opacos.